sexta-feira, 12 de agosto de 2016

Breve Reflexão sobre os 25 Anos da Lei de Imprensa

Na comemoração dos 25 anos da Lei de Imprensa (Lei n°18/91 De 10 de Agosto), a principal legislação que rege o exercício do jornalismo e, a par da Lei do Direito à Informação, concretizam os princípios de liberdade de imprensa e expressão consagrados pela Constituição de República (2004), algumas velhas questões que assolam o exercício da actividade de imprensa no geral ainda carecem de uma profunda reflexão. 
De um tempo a esta parte pude acompanhar alguns debates promovidos nos principais órgãos de comunicação social nacional e instituições como Sindicato Nacional de Jornalistas, MISA-Moçambique, Associação das Empresas Jornalísticas (AEJ), organizações privadas que trabalham na área de fortalecimento dos media como, por exemplo, IREX-Moçambique e demais organizações da sociedade civil, onde se discutiram as principais questões relacionadas à prática do jornalismo. 
Um dos pontos inúmeras vezes dignas de discussão tem a ver com questão da inibição do duplo exercício do papel de assessor de imprensa e jornalista, visto haver conflitos de interesse para aqueles que exercem simultaneamente ambas funções. Bem assim, vezes sem conta, reflectiu-se sobre a concepção e introdução da carteira profissional do jornalista cuja aprovação definiria quem deve o não ser jornalista no país. Em relação a este último ponto, tendo em consideração os atropelos das mais básicas regras do exercício de jornalismo, alguns escribas sugeriam que a introdução de carteira profissional poderia limitar o acesso de qualquer indivíduo à prática de jornalismo através de uma clara descrição dos aspectos de elegibilidade para o exercício desta actividade, a fim de que se reduza os possíveis casos de violação das regras vigentes no jornalismo.
O grande dilema, entretanto, com o qual se depara toda vez que se promovem debates tendentes a se analisar a possibilidade de introdução de Carteira Profissional é o facto de a própria Lei de Imprensa ser demasiado brando para o exercício do jornalismo. Isso pelo facto de esta lei ordinária apresentar uma definição lato sensu do conceito Jornalista. Por exemplo, refere a Lei n°18/91 que, “entende-se por jornalista... o profissional que se dedica a pesquisa, recolha, selecção, elaboração e apresentação pública acontecimento sob forma noticiosa, informando ou opinando, através dos meios de comunicação social, e para quem esta actividade constitua profissão principal, permanente e remunerada”, artigo 26. 
Tendo em análise a definição acima, emerge uma outra questão relativa ao enquadramento da Lei de Imprensa na actual esfera da prática do jornalismo. Alguns escribas explicam a definição generalista do conceito “Jornalista” alegando o facto de, aquando da sua aprovação, o país não possuia instituições de formação desta classe profissional. Hoje, porém, o país tem instituições que leccionam cursos de Jornalismo desde o nível médio até ao superior, daí que um dos motivos por que a Lei do Direito à Informação deveria ser revista justifica-se por esta não fazer menção à necessidade de se ter uma formação profissional para o exercício da actividade.
Particularmente, penso que qualidade de que tanto se deseja no jornalismo passa necessariamente por se definir com precisão quem é ou deve ser jornalista.Uma vez já se ter concebido um projecto de revisão da actual Lei de Imprensa, penso que um dos pontos que se podia incluir é a exigência de uma formação profissional em Jornalismo. Quanto aos critérios, todavia, para atribuição da Carteira Profissional de Jornalismo, deveriam ser melhor discutidos e não se restringir unicamente a sua concessão aos indivíduos de formação na respectiva área, visto que historicamente esta actividade sempre teve o seu carácter “liberal” e hoje temos no país muitos bons jornalistas que não têm propriamente a formação da área, mas sim se tornaram bons escribas através da prática quotidiana da actividade.

Sobre a Liberdade de Imprensa e Expressão
Vivemos um momento bom no que se refere à liberdade de imprensa e expressão. Hoje, verifica-se uma proliferação de órgãos de comunicação, o que reflecte uma maior abertura para o exercício de jornalismo e os casos complexos relativos à corrupção na Função Pública e envolvendo dirigentes, assim como a má gestão da coisa pública reportados pelos media nacionais constituem um indicador positivo de avaliação da liberdade de imprensa e expressão.  
No entanto, grandes desafios ainda se podem visualizar pela frente. O exercício da liberdade de imprensa e expressão continua enfrentando árduas batalhas e busca sobreviver perante a ameaças dos poder político e económico. Depois da morte do jornalista Carlos Cardoso em 2001, em Agosto do ano passado chegou-nos a informação de assassinato de mais um escriba, desta vez o editor do jornal electrónico “Diário de Notícias”. 
Ano passado, o jurista e reputado constitucionalista franco-moçambicano, Gilles Cistac, foi morto alegadamente pelos seus incômodos pronunciamentos sobre a possível criação de zonas autónomas em Moçambicque, um projecto que o maior partido da oposição no país tencionava implementar e suponha-se que o professor Cistac estivesse assessorando a Renamo com vista a sua concretização, o que foi uma autêntica violação à liberdade de expressão. Na sequência, as fortes investidas à liberdade expressão no passado mês de Maio, teve como alvo o analista político José Jaime Macuane raptado na sua residência e posteriormente baleado após ter, no dia anterior, participado do Programa Pontos de Vista do Grupo Soico, no qual analisava assuntos relacionados a casos de corrupção e outros assuntos polémicos.
Nestes 25 anos da Lei de Imprensa, em meio a batalhas, também se registou alguns êxitos como, por exemplo, a aprovação da Lei do Direito à Informação (LEDI) depois de quase uma década de luta para que este diploma legal fosse aprovada. Em Dezembro do ano 2014, finalmente aprovou-se a LEDI e pouco tempo depois (Outubro de 2015) o seu respectivo regulamento. Todavia, tanto a LEDI, como o seu regulamento necessitam de uma maior divulgação e, para o efeito, algumas organizações da sociedade civil têm vindo a se empenhar nesse sentido.
Reconheço a relevância da existência da Lei de Imprensa no país. Aliás, ela por si só já constitui um ganho  e reflecte para o pleno exercício da imprensa. No entanto, há que realçar que a luta em prol da liberdade de expressão e imprensa é continua e conta com contributo de cada um de nós, moçambicanos. 

Ode a liberdade de Imprensa! 
Ode a liberdade de expressão!

2 comentários:

  1. Otimo. Há fundamentalmente muito que seja feito. Mas também, diga-se, não estamos tão mal. Pelo menos temos o instrumento legal, falta uma pressão inteligente por parte dos jornalistas e a sociedade como um todo. Também é preciso uma insistente educação do bom uso deste instrumento... Obrigado pela reflexão e avante! Abs

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  2. Concordo consigo, prezado Rogério. Vamos crer que o actual cenário a que temos vindo assistir, no que se refere a uma maior abertura para o exercício da liberdade de imprensa e expressão, melhore cada vez mais.

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